sábado, 24 de setembro de 2011

Desemprego golpeia família, filhos e marido, diz Dilma na ONU

Antonio Carlos Ribeiro

O discurso da Presidenta do Brasil, Dilma Vana Rousseff, dia 21, na ONU, tornou-se histórico. Além da tradicional abertura brasileira, ela foi a primeira mulher a fazê-lo. Denunciou o risco de ruptura da crise econômica, ofereceu ajuda nas áreas alimentar, agrícola, energética e de combate à fome. Lembrou que o Brasil já reconheceu o Estado Palestino e destacou o papel das mulheres na superação.


Discurso direto, sem vaidades, ressentimentos ou oportunismos. Sua humildade, como chefe de Estado, se mostrou na visão econômica, no compromisso com a democracia, na crítica ao uso de força militar e na disposição de partilhar conquistas. Com orgulho autêntico. Foi aplaudida lá e calou a oposição aqui.

Sua principal ênfase foi a economia. Alertou que “a crise econômica, se não debelada pode se transformar em uma grave ruptura política e social”. Fustigou lideranças dos países desenvolvidos, em que a luta pelo comando mundial rouba a vantagem das condições, dizendo que não encontraram solução por falta de recursos políticos e clareza de ideias, provocou.

Os governos se encolhem e a crise cresce, metaforizou. “A face mais amarga da crise – a do desemprego – se amplia”, observando que dos 205 milhões de desempregados, 58 milhões estão nos EUA e na Europa. E alertou que “é vital combater essa praga e impedir que se alastre para outras regiões do Planeta”.

Conquistou a atenção da liderança ao trazer o tema para o cotidiano, com olhar feminino. “Nós, mulheres, sabemos, mais que ninguém, que o desemprego não é apenas uma estatística. Golpeia as famílias, nossos filhos e nossos maridos. Tira a esperança e deixa a violência e a dor”.

Em seguida, lidou com o tema mais amargo para a diplomacia dos países desenvolvidos: a crise é econômica, de governança e de coordenação política. Lembrou que a retomada da liderança se distancia enquanto a ONU não coordena sua atuação com organismos multilaterais como o G-20, o Fundo Monetário e o Banco Mundial entre outros. E pediu “sinais claros de coesão política e de coordenação macroeconômica”, apontou.

Para não ficar só na crítica, indicou que “os países mais desenvolvidos precisam praticar políticas coordenadas de estímulo às economias extremamente debilitadas pela crise”, e de forma global, que “países altamente superavitários devem estimular seus mercados internos e, quando for o caso, flexibilizar suas políticas cambiais, de maneira a cooperar para o reequilíbrio da demanda”.

Assumiu a cota de responsabilidade ao observar que “os países emergentes podem ajudar”, antecipando-se à pergunta que os países mais ricos gostam de fazer sobre o que oferecem os que criticam. Indicou caminhos ao dizer que “a reforma das instituições financeiras multilaterais deve, sem sombra de dúvida, prosseguir, aumentando a participação dos países emergentes, principais responsáveis pelo crescimento da economia mundial”.

Referendou a própria ao lembrar que “o Brasil está fazendo a sua parte. Com sacrifício, mas com discernimento, mantemos os gastos do governo sob rigoroso controle, a ponto de gerar vultoso superávit nas contas públicas, sem que isso comprometa o êxito das políticas sociais, nem nosso ritmo de investimento e de crescimento”, base da autoridade para repetir que “é preciso combater as causas, e não só as consequências da instabilidade global”.

Lembrou a contribuição que o país já presta no Haiti e na Guiné-Bissau, desde 2004, com segurança, projetos humanitários e desenvolvimento. E anunciou convicta: “Estamos aptos a prestar também uma contribuição solidária, aos países irmãos do mundo em desenvolvimento, em matéria de segurança alimentar, tecnologia agrícola, geração de energia limpa e renovável e no combate à pobreza e à fome”.

Na mesma linha de raciocínio, criticou a negação orquestrada da soberania à Palestina. “Repudiamos com veemência as repressões brutais que vitimam populações civis”. Insistiu que “o recurso à força deve ser sempre a última alternativa” e que “a busca da paz e da segurança no mundo não pode limitar-se a intervenções”. Deixou claro que estas “agravaram os conflitos, possibilitando a infiltração do terrorismo onde ele não existia, inaugurando novos ciclos de violência, multiplicando os números de vítimas civis”.

E nomeou o setor responsável pelo desastre na ordem política, o Conselho de Segurança. Afirmou categórica que sua atuação “é essencial, e ela será tão mais acertada quanto mais legítimas forem suas decisões. E a legitimidade do próprio Conselho depende, cada dia mais, de sua reforma”, que começa o 18º ano. Por isso, “a cada ano que passa, mais urgente se faz uma solução para a falta de representatividade do Conselho de Segurança, o que corrói sua eficácia”.

De novo, apontou soluções e assumiu compromissos. “O Brasil está pronto a assumir suas responsabilidades” e disse as razões. “Vivemos em paz com nossos vizinhos há mais de 140 anos. Temos promovido com eles bem-sucedidos processos de integração e de cooperação. Abdicamos, por compromisso constitucional, do uso da energia nuclear para fins que não sejam pacíficos”. E assegurou “o Brasil é um vetor de paz, estabilidade e prosperidade em sua região”.

E deu razões práticas. “No Conselho de Direitos Humanos, atuamos inspirados por nossa própria história de superação. Queremos para os outros países o que queremos para nós mesmos. O autoritarismo, a xenofobia, a miséria, a pena capital, a discriminação, todos são algozes dos direitos humanos. Há violações em todos os países, sem exceção. Reconheçamos esta realidade e aceitemos, todos, as críticas”, conclamou.

No tema do meio ambiente, também assumiu as convicções dos brasileiros. “O Brasil defende um acordo global, abrangente e ambicioso para combater a mudança do clima no marco das Nações Unidas”. Disse que espera avanços da “reunião de Durban, apoiando os países em desenvolvimento nos seus esforços de redução de emissões e garantindo que os países desenvolvidos cumprirão suas obrigações”. E reiterou convite para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, em junho de 2012.

Juntou dois temas especialmente importantes: o combate à pobreza e o papel da mulher. “O Brasil descobriu que a melhor política de desenvolvimento é o combate à pobreza. E que uma verdadeira política de direitos humanos tem por base a diminuição da desigualdade e da discriminação entre as pessoas”, lembrando que 40 milhões de pessoas migraram da pobreza para a classe média.

Afirmou ter “plena convicção de que cumpriremos nossa meta de, até o final do meu governo, erradicar a pobreza extrema no Brasil”, apresentando a base do argumento. “No meu país, a mulher tem sido fundamental na superação das desigualdades sociais. Nossos programas de distribuição de renda têm nas mães a figura central”.

Ao mesmo tempo, admitiu que “ainda precisa fazer muito mais pela valorização e afirmação da mulher. Ao falar disso, cumprimento o secretário-geral Ban Ki-moon pela prioridade que tem conferido às mulheres em sua gestão à frente das Nações Unidas. Saúdo, em especial, a criação da ONU Mulher e sua diretora-executiva, Michelle Bachelet”, registrou.

E concluiu, dizendo representar as mulheres do mundo, das que passam fome e não podem alimentar os filhos às que conquistaram espaço de poder. “Como mulher que sofreu tortura no cárcere, sei como são importantes os valores da democracia, da justiça, dos direitos humanos e da liberdade”. E, com esperança nestes valores, abriu o Debate Geral da 66ª Assembleia Geral da ONU.

Brilhou!

Nenhum comentário:

Total de visualizações de página