terça-feira, 18 de dezembro de 2012

A ditadura, em cores, por um adolescente


Antonio Carlos Ribeiro

Rio de Janeiro – O olhar de um adolescente sensível, que se adapta à condição da família e enfrenta todas as perdas – de forma violenta e brutal – é o tema de ‘Infância Clandestina’ (Infancia clandestina, dirigido por Benjamín Ávila, com Natália Oreiro, Teo Gutiérrez Romero, Benjamín Ávila e Ernesto Alterio, produzido por Luis Puenzo e roteirizado por Marcelo Müller, 112 min., Argentina, Espanha, Brasil, 2011, drama). Esse olhar é o gerador do relato traumático, o mesmo que subjaz as reações intempestivas e elabora as perdas.


O filme integra uma boa safra de filmes que tratam do tema das ditaduras latino-americanas, como o brasileiro O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias, 2006, de Cao Hamburger, e o alemão O Dia em que não nasci (Das lied in mir), 2010, de Florian Cassem, que mostram o impacto da repressão sobre a personalidade em formação. Com diferenças como a história que pode ser retomada, a que fica ‘amarrada’ ao relato e a sensação de que faltam relatos para que o tema seja encerrado.

O filme tem coragem de mexer com a ditadura, o tema tabu que quanto mais é tamponado, mais surge no discurso da mídia patética – que disfarça o fato de ter sido o principal sustentáculo – e ainda contando com o golpismo, assim como Beckett em Esperando Godot, ou da decadente elite que tenta a judicialização da política com vistas a administrar a sociedade e controlar os demais poderes, ou de partidos de perfil ‘udenista’, sem discurso nem articulação e dependentes das mídias editorializadas, reduzidas a folhetins de direita.

A película rediscute o tema pelo olhar de um menino, filho de militantes, que apoia e colabora com os pais, se recusa a cantar o hino nacional por distinguir cinismo e civismo que negam a humanidade, ter afetividade à flor da pele, amar a menina que o encanta e se negar a hastear a bandeira, sangrada pela ditadura. Atitudes que lembram o argumento da teóloga Marcela Althaus Reid ao lançar Indecent Theology e explicar que cresceu na ditadura com os militares falando em decência, o que a fez decidir: ‘prefiro ser indecente!’

Faz uma crônica do cotidiano da militância armada: o confronto com as forças da repressão, a fuga para se rearticular, o retorno para o campo de atuação, com moradia e trabalho na periferia, e os conflitos familiares. Neles transparecem as regras de segurança, o treinamento de guerrilha, os disfarces na atividade profissional, o comando e a integração dos militantes e a maneira de lidar com os que tombaram nos anos de chumbo.

O perfil do filme é o de filhos de militantes que relutam em entender, ou entendem e assumem a condição dos pais, por amor e que, invariavelmente, sofrem os solavancos do cotidiano, ao passo em que desenvolvem seu caráter de vítimas da ditadura assumida pelas elites, que tinham nos militares seus empregados, nos empresários os que a financiavam – uma TV somou concessões ao comprar emissoras falidas e apoiar o golpe, chegando a se dizer a 4ª maior do mundo – forçados a mentir e omitir despudoradamente, divulgar relatos fabricados nas casernas – mesmo sem nenhum nexo – descobrindo sua vocação na lógica prostituída do golpismo.

Infância Clandestina adota uma narrativa inquieta – de roteiro preciso, diálogos bem marcados e gestos intensos – do sofrimento à alegria, vindo de uma cinematografia bem elaborada, sem efeitos eletrônicos, chegando ao máximo dos quadrinhos, especialmente nos momentos de terror, a ponto de ser escolhido pela Secretaria de Cultura para representar a Argentina no Oscar.

O Brasil participa da obra – além da Espanha – como coprodutores de Infância Clandestina, e através de argentinos e brasileiros atuando como atores, roteiristas e diretor. Entre eles a atriz Mayana Neiva e o ator Douglas Simões integram o elenco, assim como o roteirista Marcelo Müller, que atuou com o diretor Benjamín Ávila. Estes estudaram juntos na Escuela de TV y Cine, de San Antonio de los Baños, em Cuba.

Além das boas relações vividas entre Brasil, este é também o território de onde retorna de Cuba à Argentina a família de militantes montoneros, composta do pai (Cezar Troncoso), da mãe (Natalia Oeiro), do menino Juan (Teo Gutiérrez Romero), e do tio Beto (Ernesto Alterio), para se reintegrar à luta contra a ditadura militar. O disfarce é o trabalho numa fábrica, onde produzem e vendem doces, e o menino Juan, autor da narrativa, se transforma em Ernesto e simula o sotaque próprio da província de Córdoba.

O diretor Benjamín Ávila diz que, para contar essa história, se inspirou em sua própria experiência de vida. Filho de uma "família clandestina", que lutou contra a ditadura militar argentina e não poupou os próprios filhos de sacrifícios. Sua mãe "desapareceu" após ser presa no fim dos anos 70. O ar ofegante do personagem Ernesto é o do próprio Ávila, que teve o corpo e a alma marcados pela clandestinidade da vida escondida, do nome falso e da violenta e constante repressão dos militares e agentes civis dos generais-presidentes.

A forte dramaticidade não volta apenas pelo figurino, o corte dos cabelos, o modelo dos automóveis, os diálogos tensos com a avó – a única que restou a Ernesto após voltar a ser Juan – mas nos ritos para treinar militantes, nas palavras de ordem e nos cerimoniais de lembrança e despedida dos ‘companheiros’, que o bispo católico d. Mauro Morelli lembra ser eucarística por marcar os que dividiram o mesmo pão e ‘caíram’ no confronto com agentes do Estado nos anos de chumbo.

A diferença básica de Infância Clandestina, na descrição das circunstâncias da tortura e da crueldade extrema, fica clara na última cena, ao ser abandonado em frente à casa da avó, após perguntar pela irmã de poucos meses e ser chamado de ‘hijo de puta’ pelo policial, e bater na porta. No simulacro de eternidade entre a pergunta: ‘quem é?’ e resposta seca ‘Juan’, o filme estanca, como o estampido dos ritos do maior massacre de civis do continente.

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=YPpQYZIYDhk

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Van Dijk: o controle através do modelo mental


Antonio Carlos Ribeiro

Rio de Janeiro – A palestra do professor Teun A. van Dijk, da Universidade Pompeu Fabra, Barcelona, sobre Discurso, poder, ideologia, promovida pelo Programa de Pós-graduação Estudos da Linguagem, do Departamento de Letras, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), mostrou como o controle do discurso passa pelo contexto, a linguagem, a identidade e os objetivos. O encontro foi no dia 4 de dezembro, no edifício Frings.

Van Dijk é um renomado especialista na área de estudos críticos do discurso e tem desenvolvido projetos de pesquisa sobre discurso e ideologia, racismo e discurso, teoria do contexto, discurso e conhecimento, nos últimos anos. Para ele, os estudos críticos do discurso, das noções de poder e da ideologia têm um papel fundamental. Partindo de uma abordagem sociocognitiva, ele apresentou uma teoria multidisciplinar acerca da reprodução discursiva das ideologias e da estratégia de reproduzir o poder dos grupos sociais dominantes.


Quem controla o discurso, controla o poder e os efeitos do discurso sobre a sociedade, já que discurso é texto contextualizado, revela o controle sobre os meios, os espaços e a ideologia. Essa análise inclui elementos de psicologia, filosofia e neuro-psicologia, detectando até mesmo os elementos que tornam a interação impossível, tomando em conta o tempo de conversa, identidade, objetivos, contexto e espaço das pessoas integrantes do discurso.

Para monitorar temas e tópicos no público leitor, os donos de jornal, afirmou van Dijk, controlam o enfoque e determinam a maneira como tal assunto será abordado. Essa estratégia é mais visível no caso de temas e grupos humanos ideologicamente rejeitados como imigração, negritude e cultura, sobre os quais projetam a polarização positivo x negativo, a ênfase para os interesses dos grupos dominantes que o veículo representa, com as quais tentam ‘amoldar’ os leitores à ‘estrutura sócio-cognitiva dos centros de poder’.

Como a intenção deliberada é controlar a opinião das pessoas, desenvolvem uma macro-estrutura semântica que considera a lista dos temas que serão tratados e rejeitados, tipificando-os com um tom de ameaça e mostrando ênfases negativas sobre sua presença na sociedade. Ao mesmo tempo atenua, mitiga e esconde os medos e inseguranças da sociedade. Isso é visível na proporção do jornal europeu que publica por ano 4.000 artigos sobre imigrantes e apenas 40 sobre o rascimo dos moradores do velho continente.

Outro recurso a compor esta estratégia são as estruturas léxicas. O uso da palavra ‘ilegal’ e outras igualmente negativas suscita a questão sobre quem fala. Nesse caso, são pessoas da classe social dominante. Ele observa que se pode até ouvir membros daquele grupo, mas nunca sozinhos, sempre com outros ‘textos enviezados’ de gente bem nascida. Isso nos remete à metáfora, outro recurso usado frequentemente nos textos. “Os imigrantes chegam à Europa em ondas”, sinalizando algo que ameaça a sociedade de forma múltipla, podendo ‘afogar’, ao mesmo tempo que tira a ênfase das ações violentas da polícia e do segregacionismo disfarçados dos governos, colocando o relato explicativo na voz passiva.

No livro ‘Language and control’ são estudadas as estruturas sintáticas que atenuam ou enfatizam, controlando as estruturas discursivas ao controlar o discurso. Usam o recurso da suposição, falando como se todos os europeus soubessem do que se trata. Isso possibilita compreender o modelo mental dentro dos discursos, para construir a leitura semântica que assegura interesses. Os modelos mentais controlam não apenas o que as pessoas podem falar, mas também pensar. Ao serem usados para controlar um modelo negativo sobre indígenas, p. ex., controlam a visão do grupo inteiro.

Sistemas ideológicos como nazismo, racismo e classissismo utilizam frequentemente os modelos mentais para controlar. Segundo Gramsci, quando as pessoas participam do controle através dos modelos que assumem, isso influencia suas práticas sociais. Esse fato agrega o elemento conhecido como Teoria da Metáfora que é capaz de fazê-los incorporar (inboding) o medo.

Para que esse controle seja abrangente, utilizam-se redes simbólicas para estabelecer o controle sobre os discursos públicos. Na educação esse controle chega a temas como racismo e sexismo, sobre os quais os livros didáticos não abordam. Os que controlam grandes grupos de mídia, especialmente entretenimento e religião, usam esse poder para determinar o que será e como será tratado, através dos modelos mentais.

A estratégia do modelo mental usa a visão multidisciplinar para pesquisar mecanismos de controle dos temas – ênfases, disfarce de proconceitos, universo vocabular e composição do texto – em nível internacional. Sua maior dificuldade é o contra-modelo dos grupos de resistência, entre os quais se destacam os grupos feministas que, ao ‘entrar’ nas mais diversas mídias, acabam criando embaraços aos discursos racistas, machistas e conservadores do status quo. Pior que isso, como outros grupos de traço ideológico definido, disputam espaços de poder de discurso, desconstruindo ênfases e recuperando parte de seu potencial, especialmente através de veículos como a internet.

Uma forma de lhes contrapor a força é a expressão surgida nos Estados Unidos do ‘politicamente correto’, com o objetivo de domesticar perspectivas, frear ênfases e atenuar efeitos no nível do discurso público. Na verdade, o politicamente correto é contra-revolucionário. Essa estratégia foi usada por jornais ingleses conservadores como ‘The Sun’ e ‘The Daily Mirror’ que acusavam os grupos que denunciavam racismo e conservadorismo em geral. E disse que uma pérola do politicamente incorreto é a frase “a gente já não tem liberdade”, observando que esta é uma forma de resistir à resistência.

Diante das denúncias, veículos eletrônicos de comunicação, usam chavões como “nós temos a verdade, eles tema ideologia”, rotulando os grupos de resistência e desclassificando os valores apresentados em seu discurso e a forte crítica que estes grupos fazem aos posicionamentos da mídia conservadora. Van Dijk lembra sempre que ‘debaixo do discurso está o modelo mental’, do qual os veículos de mídia elitista sempre lança mão.

Um elemento novo que pode se tornar efetivamente um fator de resistência são os blogs ou a blogosfera, quando se referem a ele em seu conjunto. Não se sabe ainda se é uma mídia em crescimento, apesar dos muitos sinais, mas já mostrou sinais de força em disputas pontuais com os Mass Media. No entanto, o professor observou que esta é uma pesquisa empírica que precisa ser feita, sem negar a importância da distribuição viral e das vitórias na desconstrução da opinião dita consolidada dos conglomerados de mídia.

Ele lembrou ainda que a blogosfera não tem apenas discurso de resistência e nem atua como blocos organizados, mantendo a autonomia de autores, jornalistas e grupos. Por esses traços e pelos sinais de força que tem demonstrado, a atuação da blogosfera pede pesquisas empíricas sobre sua atuação, que apresente melhores resultados.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Lideranças de Igrejas Cristãs celebram os 90 anos de Jether Ramalho


Antonio Carlos Ribeiro

Rio de Janeiro – Clérigos e lideranças das Igrejas Cristãs e de entidades ecumênicas rendem homenagem ao professor Jether Pereira Ramalho no dia dos seus 90 anos. O encontro se deu no culto realizado na Igreja Cristã de Ipanema (ICI), zona sul da cidade, neste domingo, dia 2.

Além dos membros da ICI, onde Jether e Lucília são membros há décadas, a celebração reuniu ainda filhos, netos, bisnetos, membros da Igreja Congregacional de Bento Ribeiro, onde o pai de Jether foi pastor e onde seu irmão atuou como médico por muitos anos.



O pregador foi o Rev. Zwinglio da Mota Dias, do Programa de Pós-graduação em Ciências da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), que baseou sua reflexão no Profeta Jeremias e na escritora Cecília Meirelles, destacando como Jether passou por etapas: “o líder de movimentos da juventude casou-se e constituiu família, o odontólogo cedeu ao professor, sociólogo e político, o militante anti-católico converteu-se em decidido líder ecumênico”.

Como Jeremias, acentuou Dias, “foi convocado por Javé a proclamar o direito e o dever de todos quanto à vida, assumiu o poder misterioso da Palavra, com a verdade na frente e a história na mão, nunca lamentou sua sorte, enfrentou o deserto e celebrou, carregado pelo vento selvagem e impetuoso que recria a vida”, agregou.

Insistiu que “as palavras do profeta não são ciência, profetas e poetas sabem que só seremos humanos juntos, não sozinhos... e que a verdade é a que está plantada na Verdade de todas as religiões”, disse ao saudar o companheiro de muitas décadas de trabalho conjunto, em prol de causas e compromissos a que não podiam faltar.

A celebração contou com a presença de personalidades como o sociólogo Carlos Alberto Gómez, que atuou no Centro de Estatística e Investigação Social (CERIS) da CNBB, Maria Helena Arrochelas, professor Lino e Padre José Oscar Beozzo, do Centro Alceu Amoroso Lima para a Liberdade (CAALL), do sociólogo e ex-frade dominicano Ivo Lesbaupin, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, do Reverendo Mozart Noronha, da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, e da professora Maria Clara Bingemer, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

Clérigos/as das Igrejas cristãs celebram Advento no Cristo Redentor


Antonio Carlos Ribeiro

Rio de Janeiro – Clérigos e clérigas das Igrejas-membro do Conselho de Igrejas Cristãs do Estado do Rio de Janeiro (CONIC-Rio) celebraram o início do Advento – tempo de preparação e espera do Natal de Jesus Cristo – no Cristo Redentor, na 6ª feira, dia 30 de novembro.



Sob o lema “Colocar-se a caminho em direção ao outro...”, a liturgia presidida por D. Nelson Francelino, da Igreja Católica Apostólica Romana, teve ainda o rev. Paulo Roberto, vice-presidente, da Igreja Cristã de Ipanema; a pastora Christine Drini, segunda secretaria, da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, o pastor José Roberto Cavalcante, primeiro secretário, da Igreja Presbiteriana Unida e o reverendo Daniel Rangel, tesoureiro, da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, representando as igrejas.

Durante a cerimônia foi acesa a Coroa de Advento, feita uma oração e a leitura do Evangelho de Lucas 2.15-16, com a participação dos representantes das Igrejas no momento de meditação, seguido da intercessão, o Abraço da Paz, a oração do Pai Nosso, a Bênção e o Envio.

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