terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Van Dijk: o controle através do modelo mental


Antonio Carlos Ribeiro

Rio de Janeiro – A palestra do professor Teun A. van Dijk, da Universidade Pompeu Fabra, Barcelona, sobre Discurso, poder, ideologia, promovida pelo Programa de Pós-graduação Estudos da Linguagem, do Departamento de Letras, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), mostrou como o controle do discurso passa pelo contexto, a linguagem, a identidade e os objetivos. O encontro foi no dia 4 de dezembro, no edifício Frings.

Van Dijk é um renomado especialista na área de estudos críticos do discurso e tem desenvolvido projetos de pesquisa sobre discurso e ideologia, racismo e discurso, teoria do contexto, discurso e conhecimento, nos últimos anos. Para ele, os estudos críticos do discurso, das noções de poder e da ideologia têm um papel fundamental. Partindo de uma abordagem sociocognitiva, ele apresentou uma teoria multidisciplinar acerca da reprodução discursiva das ideologias e da estratégia de reproduzir o poder dos grupos sociais dominantes.


Quem controla o discurso, controla o poder e os efeitos do discurso sobre a sociedade, já que discurso é texto contextualizado, revela o controle sobre os meios, os espaços e a ideologia. Essa análise inclui elementos de psicologia, filosofia e neuro-psicologia, detectando até mesmo os elementos que tornam a interação impossível, tomando em conta o tempo de conversa, identidade, objetivos, contexto e espaço das pessoas integrantes do discurso.

Para monitorar temas e tópicos no público leitor, os donos de jornal, afirmou van Dijk, controlam o enfoque e determinam a maneira como tal assunto será abordado. Essa estratégia é mais visível no caso de temas e grupos humanos ideologicamente rejeitados como imigração, negritude e cultura, sobre os quais projetam a polarização positivo x negativo, a ênfase para os interesses dos grupos dominantes que o veículo representa, com as quais tentam ‘amoldar’ os leitores à ‘estrutura sócio-cognitiva dos centros de poder’.

Como a intenção deliberada é controlar a opinião das pessoas, desenvolvem uma macro-estrutura semântica que considera a lista dos temas que serão tratados e rejeitados, tipificando-os com um tom de ameaça e mostrando ênfases negativas sobre sua presença na sociedade. Ao mesmo tempo atenua, mitiga e esconde os medos e inseguranças da sociedade. Isso é visível na proporção do jornal europeu que publica por ano 4.000 artigos sobre imigrantes e apenas 40 sobre o rascimo dos moradores do velho continente.

Outro recurso a compor esta estratégia são as estruturas léxicas. O uso da palavra ‘ilegal’ e outras igualmente negativas suscita a questão sobre quem fala. Nesse caso, são pessoas da classe social dominante. Ele observa que se pode até ouvir membros daquele grupo, mas nunca sozinhos, sempre com outros ‘textos enviezados’ de gente bem nascida. Isso nos remete à metáfora, outro recurso usado frequentemente nos textos. “Os imigrantes chegam à Europa em ondas”, sinalizando algo que ameaça a sociedade de forma múltipla, podendo ‘afogar’, ao mesmo tempo que tira a ênfase das ações violentas da polícia e do segregacionismo disfarçados dos governos, colocando o relato explicativo na voz passiva.

No livro ‘Language and control’ são estudadas as estruturas sintáticas que atenuam ou enfatizam, controlando as estruturas discursivas ao controlar o discurso. Usam o recurso da suposição, falando como se todos os europeus soubessem do que se trata. Isso possibilita compreender o modelo mental dentro dos discursos, para construir a leitura semântica que assegura interesses. Os modelos mentais controlam não apenas o que as pessoas podem falar, mas também pensar. Ao serem usados para controlar um modelo negativo sobre indígenas, p. ex., controlam a visão do grupo inteiro.

Sistemas ideológicos como nazismo, racismo e classissismo utilizam frequentemente os modelos mentais para controlar. Segundo Gramsci, quando as pessoas participam do controle através dos modelos que assumem, isso influencia suas práticas sociais. Esse fato agrega o elemento conhecido como Teoria da Metáfora que é capaz de fazê-los incorporar (inboding) o medo.

Para que esse controle seja abrangente, utilizam-se redes simbólicas para estabelecer o controle sobre os discursos públicos. Na educação esse controle chega a temas como racismo e sexismo, sobre os quais os livros didáticos não abordam. Os que controlam grandes grupos de mídia, especialmente entretenimento e religião, usam esse poder para determinar o que será e como será tratado, através dos modelos mentais.

A estratégia do modelo mental usa a visão multidisciplinar para pesquisar mecanismos de controle dos temas – ênfases, disfarce de proconceitos, universo vocabular e composição do texto – em nível internacional. Sua maior dificuldade é o contra-modelo dos grupos de resistência, entre os quais se destacam os grupos feministas que, ao ‘entrar’ nas mais diversas mídias, acabam criando embaraços aos discursos racistas, machistas e conservadores do status quo. Pior que isso, como outros grupos de traço ideológico definido, disputam espaços de poder de discurso, desconstruindo ênfases e recuperando parte de seu potencial, especialmente através de veículos como a internet.

Uma forma de lhes contrapor a força é a expressão surgida nos Estados Unidos do ‘politicamente correto’, com o objetivo de domesticar perspectivas, frear ênfases e atenuar efeitos no nível do discurso público. Na verdade, o politicamente correto é contra-revolucionário. Essa estratégia foi usada por jornais ingleses conservadores como ‘The Sun’ e ‘The Daily Mirror’ que acusavam os grupos que denunciavam racismo e conservadorismo em geral. E disse que uma pérola do politicamente incorreto é a frase “a gente já não tem liberdade”, observando que esta é uma forma de resistir à resistência.

Diante das denúncias, veículos eletrônicos de comunicação, usam chavões como “nós temos a verdade, eles tema ideologia”, rotulando os grupos de resistência e desclassificando os valores apresentados em seu discurso e a forte crítica que estes grupos fazem aos posicionamentos da mídia conservadora. Van Dijk lembra sempre que ‘debaixo do discurso está o modelo mental’, do qual os veículos de mídia elitista sempre lança mão.

Um elemento novo que pode se tornar efetivamente um fator de resistência são os blogs ou a blogosfera, quando se referem a ele em seu conjunto. Não se sabe ainda se é uma mídia em crescimento, apesar dos muitos sinais, mas já mostrou sinais de força em disputas pontuais com os Mass Media. No entanto, o professor observou que esta é uma pesquisa empírica que precisa ser feita, sem negar a importância da distribuição viral e das vitórias na desconstrução da opinião dita consolidada dos conglomerados de mídia.

Ele lembrou ainda que a blogosfera não tem apenas discurso de resistência e nem atua como blocos organizados, mantendo a autonomia de autores, jornalistas e grupos. Por esses traços e pelos sinais de força que tem demonstrado, a atuação da blogosfera pede pesquisas empíricas sobre sua atuação, que apresente melhores resultados.

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