domingo, 4 de dezembro de 2011

Do olhar firme ao envergonhado

Antonio Carlos Ribeiro

O tempo possibilita uma leitura dos fatos que permite a aproximação e o distanciamento. A primeira se fixa nas imagens que, como ensinaram os chineses, valem mais que mil palavras. O segundo, o distanciamento, possibilita o olhar decorrente da ação do tempo, a posteriori e movidos pelas razões que elucidaram os fatos, buscaram seus sentidos e revelaram seus significados.

O substantivo surge da necessidade de fixar o sentido da substantia, a essência da coisa, mas que muitas vezes trai esse sentido. É o caso da imprensa de elite que busca controlar nossa relação com a realidade, de forma a seguir lucrando com os interesses que levaram o maior grupo a conquistar cerca de 70% do mercado de comunicação.

Depois do fim da ditadura a imprensa começou a perder lentamente seus instrumentos de poder. Só recentemente – com os novos critérios de distribuição das verbas de comunicação do governo federal – esse processo começou a sofrer mudança mais significativa, chegando à pequena imprensa, com custos muito menores e muito maior alcance.

Esse processo, com todos os limites e pressões das elites brasileiras, tem possibilitado o acesso à informação de um número maior de pessoas e, consequentemente, de intervenção em quantidade cada vez maior e de melhor qualidade.

Esses grupos da sociedade, que apoiaram a ditadura militar, sofreram certo revés com a publicação da foto da guerrilheira Dilma Vana Rousseff, com apenas 22 anos e após 22 dias de tortura na carceragem em São Paulo.


Dilma “aparece” em novembro de 1970 – numa época em centenas de militantes desapareceram – na sede da Auditoria Militar no Rio de Janeiro. Ao fundo, os oficiais nervosos e envergonhados, que a interrogavam sobre sua participação na luta armada. O surpreendente é que os militares, uniformizados e no exercício das funções, escondem o rosto com a mão, envergonhados, ao tempo que a guerrilheira mantém o olhar firme, mesmo que o corpo franzino dê sinais da sevícia.

A foto aparece no livro A vida quer coragem, do jornalista Ricardo Amaral e publicado pela editora Primeiro Plano, que chega às livrarias essa semana. A obra conta a trajetória da universitária, que não faltou à época em que o país esteve entregue ao arbítrio – durante um interrogatório na sede da Auditoria Militar do Rio de Janeiro – da qual saiu para se tornar a primeira mulher a chegar ao Palácio do Planalto.

E, em decorrência das eleições, nas quais parte dessas forças era composta dos ressentidos da guerra, do submundo das igrejas e das tramas políticas, empresariais e da imprensa, ela foi eleita Presidenta e se tornou a comandante em chefe das Forças Armadas.

Com o olhar que ressignifica os fatos a partir das imagens, é possível perceber a guerrilheira de olhar firme e decidido e o olhar envergonhado dos militares. E, consequentemente, entender como e porque ela chegou lá, ao tempo que quem exerceu o poder com tanta truculência e tão pouca dignidade, se prepara para ouvir a história que protagonizaram, apenas ouvindo, já que o direito de intervir no relato, lhes exige apenas admitir as culpas.

3 comentários:

Passos disse...

Amigo, que transcendência seu BLOG. Há tanto tempo,submerso sobre torrentes de atividades, o leio sem exprimir a imensa grandeza do que produzes como teólogo, jornalista e militante. Agradeço sua reflexão de hoje. Tão emocionante com a densidade desta foto. Creio que temos agora um motivo enorme para apostar que Dilma mantenha a grandeza, a dignidade, a beleza, a força e o "veneno" da mulher, necessário para suplantar a vileza deste também envergonhado Congresso brasileiro, que nem a cara esconde, para praticar a mesma traição ao povo brasileiro. O Espírito de Deus com você Sempre.

Blog das Pastoras Batistas da CBB disse...

Caro Antonio,

Essa foto e esse texto são, ao mesmo tempo, vergonha desse país e celebração da coragem dessa mulher e de tantos no enfrentamento das "forças de morte", sejam da política, sejam da religião, sejam de indivíduos pernósticos.
Abraço fraterno,
Silvia Nogueira, Pra.

Lucio disse...

Não eram democratas os militares que estavam no poder. Tampouco eram democratas aqueles que tentavam derrubar os militares do poder. O grupo da Presidente Dilma não buscava instalar um regime democrático no país, queriam uma ditadura socialista. Assim como os militares O GRUPO QUE A PRESIDENTE DILMA PARTICIPAVA, cometeu inúmeras atrocidades. É lógico que em número menor, até porque tinham uma estrutura inferior. Presidenta Dilma, Militares, Socialistas envolvidos nessa baderna da Ditadura, que cometeram crimes merecem punições.

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