segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Nórdicos enfrentam a nova onda de violência

Antonio Carlos Ribeiro

Os países nórdicos têm quatro países entre os 20 com maior índice de desenvolvimento humano (IDH) do planeta. Noruega, Suécia, Dinamarca e Finlândia, no extremo Norte da Europa, sempre foram vistos com um misto de inveja e admiração. Nesse conjunto harmônico parecia, ao resto do mundo, a civilização parecia estar um passo à frente. Mas os últimos anos trouxeram a ascensão da extrema-direita.



Esse corpo estranho de ideias, acalentadas pelas elites econômicas e sociais conservadoras, ciosas do que entendem serem seus direitos e aprisionados a uma ideologia e prática radicais, que voltou a atormentar. Até o último dia 22, eram os sítios dos partidos de direita, alguns editados na periferia do continente e direcionados à juventude, e até então voltados ao jogo das disputas políticas.

Mas naquela sexta-feira, dia 22, após Anders Behring Breivik instalar explosivos em escritório governamentais e atirar em gente distraída, inocente e desarmada, eles se defrontaram com o horror, presente em 77 corpos. A forma mais triste de serem apresentados ao terrorismo em massa. Os males com que vizinhos europeus já se debatiam.

Pior que isso, ao acordar do pesadelo, noruegueses e os demais países escandinavos viram as superpotências oferecerem serviços de inteligência, agentes, armamentos e parte de sua imprensa indicar os islâmicos como inimigos. Esta última foi a forma mais - por vezes invisível - cruel de contribuir para o caos que o mundo ocidental vive.

Quem leu o New York Times creu que a ameaça vinha do “Islã radical”, sem perceber que estava sendo gestada entre os jovens bem-sucedidos, formados, empregados, e alguns vulneráveis ao discurso da direita. E não nos imigrantes, em busca de trabalho e sobrevivência.

Além das mortes, o impacto foi perceber que o mal-estar da civilização, como afirmou Freud, não se estrutura em causas legítimas, mas em antagonismo, insatisfações e sociopatias. O horror surge entre jovens, cristãos e compatriotas que, mesmo criados há gerações com as benesses do Estado de bem-estar social se ressentem assim.

O tema dos cidadãos nórdicos é que razões que levaram um filho de diplomata, que viveu longe do pai, estudou em escola de elite e tinha vida de classe média foi envolvido pelo discurso da extrema direita e cometeu o mais hediondo crime em seu país, desde a Segunda Guerra? Talvez pelas mesmas razões que fizeram surgir este conflito.

A Escandinávia enfrenta uma crise de identidade provocada pelo excesso de discussões sobre o "problema da imigração", afirma o escritor Roman Schatz, radicado em Helsinque, na Finlândia. Autor de vários livros sobre a sociedade finlandesa e romances como Telewischn, uma paródia dos reality shows da TV, Schatz, 51, diz que a xenofobia começou a mostrar a cara há uns 15 anos.

Mas sobre Breivik, autor dos atentados em Oslo, diz tratar-se de um fenômeno diferente: um jovem solitário, numa sociedade onde a intercomunicação é reduzida, e as pessoas têm poucas preocupações materiais, mas são vazias de conteúdo. O tipo de terreno propício à extrema direita. E, provavelmente ressentida com a adesão em massa dos jovens ao Partido Trabalhista.

Lars Gule, 55, filósofo norueguês, chama a atenção para a necessidade de uma discussão maior sobre a polarização de opiniões diante das transformações pelas quais seu país e os vizinhos passaram nas últimas décadas. “Nunca fomos uma sociedade perfeita, ao contrário do que o mundo se acostumou a pensar”, diz o ex-militante de esquerda. Sem se alarmar, afirma que o atentado não significa o fracasso do modelo de social-democracia nórdica.

Ele estava entre os 150 mil noruegueses que saíram às ruas da Noruega na vigília que marcou as manifestações de repúdio aos atentados, na segunda-feira após o massacre. Depois voltou ao à tela do computador para novos bate-bocas virtuais em fóruns de extrema-direita na internet. Uma atividade em que ele vem se empenhado há anos. O Partido de Direito a que Breivik pertencia perdeu votos.

A manifestação da bispa Helga Byfuglien teve papel fundamental. Sobretudo por ser expressa em meio à maior dor. Mesmo brutalizadas, as pessoas recobram a razão. Mas as razões da sociopatia de extrema direita ainda pedem mais debates. E o confronto de ideias não pode se limitar às vias tradicionais, já sabem.

Um comentário:

Passos disse...

Antonio Carlos, você acerta de novo! Não é possível um povo locupletado compreender inteiramente a fragilidade de sua própria humanização e de seus semelhantes. Andam longe da descoberta de Levinas do que só podemos nos salvar pelo OUTRO - aquele que nos dá a noção do nosso limite. "Sartre, por ele mesmo" acessível ON LINE, disse de maneira feliz: "O ser para si é uma desgraça!"

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