Antonio
Carlos Ribeiro
O livro Desconstrução (Rio de Janeiro: Cenapsi, 2013), com
poemas de Roberto Britto, dá continuidade ao ‘Da Cruz ao Cais’, já com um olhar
mais distanciado da cruz e mais familiarizado com o cais – e sua visão mais
ampla – sem perder o foco da nova arquitetura de conceitos e linguagem, com que
se desfaz de objetos tornados abjetos na hora de fazer a mudança.
Exercício
assumido como proposta para ‘passar a limpo minhas experiências’, Desconstrução
se estrutura em eixos como cultura, religião, identidade, família e sexo,
psicanálise. Sua revolução começa admitindo que ‘é preciso calar, ouvir, ler,
refletir, escrever, inventar seu próprio idioleto’.
As
poesias rejeitam as verdades absolutas, encasteladas na alma, e exigem limpar o
terreno para o novo. Narram o ato de sair de si e da atitude que o provocou. E
como a arte nos traz os saberes em que o conhecimento formal sequer toca,
aderiu a ela. E se deixou conduzir. Desencanto se torna parte do encanto, mas
sem prisão.
Dos
medos acumulados surgiu a disposição dos enfrentamentos. Engraçar-se com a
vida, minimizar ameaças e assumir a condição humana. Admitir angústias do tempo
e prazeres comuns, recusar sublimação e integrar lobo e ovelha, amor e desamor,
novas crenças e velhas doenças, culpa em estilo romano ou consuetudinário. E ir
da letra ao espírito, na mesma carne.
Na
identidade, a des-re-construção. A cidade que escolheu para viver. Os apetites
e os acepipes. As novas leituras de mundo, do impresso ao expresso. Das
projeções paternais à necessidade de ‘cargar al real’, apalpar o cotidiano,
lidar com as dores. Na busca de sentidos, sem truques e com mistério.
Na vida
afetiva e familiar os desamores, desencontros, decepções, desacordos. Dos
remédios das revistas para salvar a relação. Das identidades, nova identidade,
liberdade, maternidade. Desapego do pai, com todos os pês. Na sexualidade, as
curvas e as expressões. ‘Não está no falo, mas na fala’. Amor próprio, o
reencontro.
Dos
conflitos aos discursos, do pessoal ao midiatizado, da intervenção individual
ou em rede, dos significados a serem depurados, do consciente ao inconsciente.
Das implicações de tudo isto no discurso. Das meias verdades como recurso do
incompleto ao altamente complexo, da castração que não impede o desejo e dos
recursos relativizados. O substantivo fala e como verbo vira falo. E do gozo,
masculino e feminino, inventado com o progresso, efêmero e interminável.
Consegue
voltar cinco séculos e retomar o lema da Escola de Navegação de Sagres, quando
os portugueses descobriram que a península podia ir além da Finisterrae e
que, para tal, navegar era imprescindível: Navigare
necessere est (Navegar é
preciso)!
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