segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Experimentar a graça, nutrir gratidão e ser gracioso

Romanos 1.16-17

Só a fé em Jesus Cristo nos coloca no âmbito da graça, vence o pecado e possibilita experimentar a Justiça de Deus. Essa é a síntese da carta que Paulo escreveu aos cristãos de Roma, grupo composto de gente oriunda da Palestina e da Síria. O apóstolo ouviu falar deles durante a segunda viagem missionária, através de Áquila e Priscila, que fugiam da perseguição do Imperador Cláudio em 49d.C. Essa carta preparava a terceira viagem (At 20.1-3), na qual projetava chegar à Espanha.

Ao dizer: Não me envergonho do evangelho, Paulo usa uma figura de linguagem (litotes) que afirma pela negação. Na verdade ele quer dizer que se gloria do evangelho e se sente honrado de defendê-lo, especialmente num mundo fortemente marcado pelo pecado e pela imposição da força. Paulo se gloria do evangelho porque seu objetivo é a "salvação de todo aquele que acredita".



Para viver o evangelho é preciso responder ao Deus que nos interpela. O ser humano pode fazer isso de dois modos: se abrir em disponibilidade ao Pai e em amor-serviço aos outros seres humanos. A compreensão cristã da fé não é histórica apenas porque se relaciona com fatos e personagens públicos, mas porque a existência escatológica (eschaton = último) é o modo cristão da historicidade humana.

É um jeito de viver a fé, que compreende a realidade do fim para o começo. Ela se efetiva lá no futuro, mas já começou agora. A história da salvação é composta da confiança depositada na experiência de fé e na promessa (passado e futuro), junto com a ação de Deus e do ser humano (presente) que criam um horizonte relacional.

Dizemos sim à salvação que Deus nos oferece no kairós, esse tempo escatológico-apocalíptico. Aceitar a salvação implica em viver dois tipos de tensão: a do amor de Deus "já" manifestado eficazmente em Cristo e a do "ainda não" da nossa decisão de servir a Deus, vivida nas limitações humanas do cotidiano. O "ainda não" significa que a resposta humana não pode ser dada de forma definitiva, de uma vez por todas, mas exige uma contínua renovação do sim já dado.

O evangelho só pode ser vivido entre o "já" da aceitação dada a Deus e o "ainda não" da plenitude do encontro entre Deus e o homem. Nesse ínterim, nos alegramos com sinais (realizações reais, embora imperfeitas: justiça, solidariedade, reconciliação, perdão, oração confiante) que tornam presente o Reino de Deus.

O Evangelho é a força que ajuda a assumir os riscos que esses compromissos implicam, enquanto se faz a experiência da salvação. A salvação não é exclusividade e nem prerrogativa de um povo, uma etnia. Ela é para todo aquele que acredita, do judeu e do grego. A razão da escolha dos hebreus no AT é o fato de serem um povo comum, composto de vários povos do deserto. Ao se sentirem privilegiados e se agarrarem no sistema de privilégios, perderam a condição pelo qual foram escolhidos: ser povo comum.

Se o critério não é o privilégio de pertencer a uma etnia, qual é? A fé. "No Evangelho a justiça se revela única e exclusivamente através da fé (v. 17). A expressão humana dos agraciados com a salvação não é por serem membros de uma etnia, mas justos (heb saddîq - no certo). O justo não tem essa condição por se diferenciar do ímpio (heb rasha' - no errado), nem por causa dos seus próprios méritos, e nem por qualquer gesto, mesmo o mais altruísta.

O justo é justo porque aceitou a salvação como um presente aberto ao futuro, sendo chamado a vivenciar a libertação interior, guiado pelo Espírito de Deus, e a doar-se em ações transformadoras na sociedade e no mundo. "É livre de todos e a ninguém submisso, pela fé, e servo de todos, pelo amor" (Lutero. Da liberdade cristã). Para entender isso, vejam este breve filme:


Quem experimenta a graça, nutre gratidão no coração, se torna gracioso com os outros e vive dessa alegria. Isso é o que aprendemos da Reforma, iniciada há 496 anos.

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