terça-feira, 26 de julho de 2011

Breivik, a Europa e a extrema direita

Antonio Carlos Ribeiro

Os fatos relacionados à tragédia norueguesa ocorrida no fim de semana, despertam nossa atenção, ao passo que repetem um enredo conhecido. Uma crise financeira ronda o continente, resistente às intervenções com regras de disciplina espartana – quarentena econômica dos países endividados, avaliações de risco que estrangulam as últimas forças e blindagem para tornar os demais países infensos ao caos – com os apelos dos partidos de extrema direita e o braço armado de jovens inseguros, ousados e com vínculos familiares e comunitários frágeis.



Os incidentes ocorridos em Oslo e na Ilha de Utoeya, que chocaram o país e o mundo, provocavam maior estarrecimento a cada novo dado levantado a respeito de Anders Behring Breivik. A frieza com que planejou o atentado, a estratégia para retardar a ação policial, o ideário exposto em 1.500 páginas e a desfaçatez de pedir audiência pública, uniformizado e explicando suas razões. Sem esquecer o crime midiático do New York Times, que culpou os muçulmanos imediatamente, só retificando a informação horas após a prisão do terrorista.

A Justiça mandou confiná-lo pelo dobro do tempo permitido, pelas agravantes, com as primeiras quatro semanas em regime fechado completo, para que a promotoria levante provas, determine os motivos e descubra os apoiadores deste auto-denominado cavaleiro templário, que não defendia ninguém, sequer cristãos, nem na Terra Santa, e nem usava armas medievais. E cuja calma no tribunal assustou o promotor Christian Hatlo.

Enquanto isso, mais 150 mil cidadãos acorreram às ruas da capital para lamentar os mortos, protestar contra o atentado e manifestar a decepção com os grupos de ultra-direita que, pasmem, abandonaram Breivik, negando apoio a seus motivos e intenções, fazendo parecer um ato individual.

Stefan Schölermann, especialista alemão em extrema direita, afirmou que os partidos populistas de extrema direita são os autores intelectuais do crime, por pregarem ideias como um medo difuso dos diferentes – dos imigrantes, dos miscigenados, dos não-cristãos, especialmente os muçulmanos – e até do casamento homossexual.

Extremistas não querem ser associados a ações semelhantes a de assassinos seriais, lembrou. Sobre o atentado, constatou que a ação foi planejada em detalhes, o assassino sabia o que fazia e agiu racionalmente. É possível que pessoas isoladas tenham ideias semelhantes e sejam influenciadas a fazer algo igualmente bombástico, alertou Schölermann. “É um perigo contra o qual não há proteção”, sentenciou.

Isso encontra eco no documento Uma declaração de independência europeia – 2083 (A European Declaration of Independence – 2083, em inglês), propondo luta armada e democracia para deter o avanço da miscigenação nos próximos anos. E, no mesmo tom escatológico, ameaçou: “Caso contrário, o continente seguiria um modelo de ‘bastardização, muito similar ao do Brasil’”, desacatando os europeus.

O norueguês Olav Fykse Tveit, Secretário Geral do Conselho Mundial de Igrejas, entidade que reúne 560 milhões de cristãos em todo o mundo, após o abalo da notícia, afirmou “ser uma blasfêmia relacionar a cristandade com as ações de um cristão conservador em luta contra conspirações marxistas e a colonização muçulmana na Europa”.

“E importante dizer a todos os muçulmanos, onde quer que estejam, na Europa ou em qualquer lugar do mundo, que estas ações não expressam de forma alguma o que é a nossa fé cristã e os nossos valores cristãos”, enfatizou Tveit.

E por último, a aparição de Jens Breivik, pai do terrorista, pode trazer a explicação mais elementar. Um diplomata aposentado que vive na França com atual mulher, se separou da mãe do atirador quando a criança tinha apenas um ano, de quem perdeu custódia numa batalha judicial. Ausente, não o via há 16 anos.

“Eu não me sinto como pai dele. Como ele pode simplesmente matar tanta gente inocente e ainda achar que o que ele fez foi normal?”, afirmou, entre estarrecido e envergonhado. Ainda em estado de choque e pressionado pelas perguntas, disparou: “Ele deveria ter se matado, também. Isso é o que ele deveria ter feito”. Numa das muitas vezes que a pergunta foi refeita, disse que o filho deveria ter se suicidado, em vez de assassinar pessoas inocentes.

Três chaves ajudam a compreensão. A primeira é a situação, reflexo da imagem que o mundo se acostumou a ver no velho continente, especialmente em épocas de crise econômica aguda. O impacto dessas crises sobre o ethos dos que se sentem parte de uma categoria especial de seres humanos (brancos, portadores da reiche Kultur, superiores e modelares), a segunda. E o recurso de empunhar a bandeira da superioridade quando os obstáculos impactam o establishment, gerando a frustração que explode na vida social. Esta última, a mais trágica.


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http://www.vg.no/nyheter/innenriks/oslobomben/lenke.php

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